Faz 41 anos eu estudava em um colégio na Tijuca, Rio. Na saída da escola, ajudava uma colega cega, Maria, a voltar para casa. Dezembro de 2009, eu e minha irmã Cláudia voltamos ao bairro. O casarão que abrigava o colégio foi demolido junto com todas as árvores que o circundavam. Virou um megamercado. Fiquei procurando, na rua lateral, marcas que estimulassem a memória do meu braço no braço de Maria. Não econtrei nada.
Invejo os trabalhadores pródigos em ferramentas. Marceneiros, vitralistas, músicos, pintores, costureiras, cozinheiras. Já redatores precisam de tão pouco. Caneta, papel ou teclado, telinha. Talvez, por conta disso, multiplico. Várias canetinhas, dezenas de lápis, cadernos, moleskines, bloquinhos, post-it(s). Mas sei que para escrever bastam um lápis e um guardanapo de qualquer gramatura.
Para contar usamos a memória (as experiências vividas). Mas também necessitamos das surpresas (o que virá pela frente). Para escrever precisamos, então, de um olho na nuca e de outro na testa. Só assim estaremos preparados para suar os dedos nas teclas de maneira proveitosa.
Não é que apareceu a heroína do século XXI? Ela é Lisbeth Salander, criada pelo sueco Sieg Larsson, na já memorável trilogia Millennium. Enfim, uma personagem para fazer companhia a Madame Bovary, a Capitu, a Ana Karenina. Guardem esse nome. Lisbeth merece!
Creio que estou conseguindo soltar da moldura. Saltar da forma fechadinha para o recado direto. Senti isso no meu texto de hoje. Estou apostando em trocar rodas por asas.
Não sei se é bom ou ruim. De anos em anos, sinto uma vontade medonha de mudar o "estilo". Sair do gesso, mesmo que ele tenha sido uma árdua conquista. Agora, quero uma escrita mais fluida. Algo mais parecido com a água. Vontade de não polir as frases em demasia. Soltar um pouco mais. Quero experimentar um jeito diferente do meu jeito de escrivinhar.
Meu nome é Fernanda Pompeu. Sou escritora no começo, no meio e no fim. Já tenho livros publicados e estou finalizando mais um: Escriba errante. Trata-se de uma autonarrativa, na qual conto os encontros e desencontros da escrita e da vida.